23 novembro, 2021

Transportar no tempo

    Há grandes mistérios nesta vida. Para mim, o maior é o das carrinhas transportadoras. Vemo-las todos os dias em todo o lado, com as duas portas, a caixa na parte de trás, quase todas brancas. Dão imenso jeito! Dá para levar estantes, caixotes, materiais, um montão de coisas, que são uma chatice de transportar num carro. Qualquer PME tem uma carrinha transportadora, nem que seja só para ter uma superfície grande o suficiente para escrever o nome.
    E aqui entra o mistério: não há carrinhas novas. É isto que me confunde. Todas as carrinhas que vemos pela rua fora são velhas. Não sei como é possível, mas é verdade. Já tive oportunidade de guiar duas carrinhas diferentes, e fiquei espantado. Principalmente, porque, para uma delas, deram-me a chave e disseram “leva a nova”. Nova, como? Só se for a matrícula, porque, de resto, eu era a única coisa nova naquela carrinha. A manete das mudanças estava solta, os plásticos eram todos velhos e vibravam por tudo e por nada, e o limpa pára-brisas só funcionava se ligasse o pisca primeiro. A embraiagem era estranha e os travões chiavam constantemente. O motor fazia um barulho horrível, daqueles que fazem pensar “se calhar era bom ir ao mecânico”, e estar parado no semáforo é ficar aos saltos como se estivéssemos no mar alto. No entanto, a matrícula era de 2018.
    O que me faz pensar noutra coisa. Quando é que as carrinhas são vendidas? Há anúncios na televisão regularmente, mas as carrinhas são sempre velhas. Como será que funciona? Fazem as carrinhas, mas só as vendem 5 anos depois, para ter uma matrícula mais recente? Ou vendem as carrinhas e esperam 5 anos para as entregar? Pode ser bom para efeitos contabilísticos. Se calhar, são as PMEs que as compram e as guardam durante 5 anos. Deve ser para amortizarem o valor, apesar de ninguém saber o que isso quer dizer. Na volta, são os contabilistas que mandam nisto tudo. A carrinha fica quieta, para não se estragar. Quando o valor total estiver amortizado, já pode ir para a estrada. Se alguém se espetar num poste, já não se perde grande coisa. Era só uma carrinha velha e a nova foi comprada há 3 anos, está quase pronta a usar.