Portugal, como um bom país latino, passa uma grande parte do
tempo à mesa. Faz parte da nossa cultura sentarmo-nos para almoçar às 2 da
tarde e só sair depois das oito da noite. Parte desse tempo é passado a comer,
mas a principal actividade é conversa.
Conversa essa que vai do tradicional futebol à comparação
entre qual partido político aldraba mais. No entanto, há um tema muito mais
importante que estes, e que volta à mesa várias vezes, que é o tema da comida.
Não a que está à nossa frente, essa leva só um “muito bom” ou “também costumo
fazer este prato”. Estar a comer, especialmente em grupo, leva a um passeio
nostálgico por todas as refeições anteriores na vida dos participantes. A
memória sensorial é muito forte. Mesmo que não tenha nada a ver com o que se
está a comer, o passeio começa quando alguém diz “isto faz-me lembrar uma vez
que comi...” e segue por caminhos exóticos de refeições no sul de França, aldeias
italianas desconhecidas, ou na Cruz Quebrada.
E vão saltando ao caminho vários pratos, de grande
variedade, de excelentes refeições passadas, que rapidamente deixam de estar
relacionadas com o que se está a comer. Um almoço de peixe assado leva a pratos
húngaros extravagantes, que levam a uma feijoada à transmontana. E aqui entra o
tópico acessório das refeições passadas: “eu gosto, mas quando é bem feita”.
Isto é um ponto importantíssimo, não vá alguém falar de feijoada ou de cozido à
portuguesa sem ser logo avisado que tinha de estar bem feito. O que seria se
alguém dissesse que gostava de lasanha, mas quando o molho branco está rançoso?
Livrai-nos do mal!
Nestes grupos, há sempre uma pessoa que sabe mais sobre
culinária do que todos os outros. Conhece a comida dos quatro cantos do mundo,
e como é feita. Se tivermos sorte, é também a pessoa que cozinha melhor. O pior
é se esta pessoa nos convida para almoçar e depois diz “Como é verão, fiz
qualquer coisa leve, o almoço é só saladas”. Nada contra as saladas, também fazem
uma boa refeição, mas quando uma pessoa que cozinha bem convida para almoçar,
quer-se algo mais. E que seja bem feito.