Eu gosto de história. Sempre adorei estudar história, e ler
livros e artigos sobre antigas civilizações, crescimento e queda de impérios,
evoluções e revoluções, descobertas, o que apanhasse. Adorava poder ter visto a
queda do Muro de Berlim, mas tinha nascido há pouco tempo e nem sabia que a
Alemanha existia, muito menos que havia duas. Mas tive sempre o desejo de viver
tempos históricos como esse, momentos que mudam o mundo da noite para o dia.
O século XX é, aliás, uma época a que gostaria de poder ter
assistido de uma ponta à outra. Não que seja melhor do que os séculos
anteriores. O Século XIX começou com as guerras Napoleónicas e acabou com a literatura
de ficção científica de H. G. Wells,
e teve as teorias revolucionárias de Karl Marx pelo meio. Cada século tem
milhares de acontecimentos marcantes, mas os do século XX puxam mais por mim.
Acho fascinante ler a evolução dos acontecimentos e pensar “como é que ninguém
deu por isto?”, e fico intrigado com a incapacidade de travar as coisas mais
negras que aconteceram nesse tempo.
Depois, como é óbvio, noto as semelhanças com a actualidade.
A “paz armada” que antecedeu a Primeira Guerra Mundial e a sua violência, e os
investimentos militares das maiores potências mundiais de hoje, mas que são
feitos apenas por precaução. O crescimento de ideologias extremistas e
opressivas no prenúncio da Segunda Guerra Mundial, e alguns dos líderes eleitos
nos últimos anos nessas mesmas potências. As crises económicas devastadoras,
quando a economia “consegue” antecipar essas crises. E, no meio disto tudo, uma
pandemia que varreu o planeta e matou milhões de pessoas num instante.
A pandemia teve algumas vantagens, como o teletrabalho. Mas
também mostrou quem manda. Durante o tempo em que tudo esteve parado, os níveis
de poluição no ar melhoraram. E tal como o melhor aluno da turma avisa o
professor que se esqueceu do trabalho de casa, alguém se lembrou que isso não
era rentável, e lá voltou tudo a funcionar. À margem disto, fazem-se
conferências para definir que a temperatura global não pode aumentar mais do que
1.5 graus. E depois, começa uma guerra, para ajudar a atingir o objectivo.
A par disto, a luta pela conquista de direitos sociais leva
uma mocada, com a auto-intitulada melhor democracia do mundo a finalmente
deixar de fingir que considera todas as pessoas iguais. Mais ou menos metade da
população deixa de poder decidir o que fazer com o seu próprio corpo, porque
não tem antecedente histórico para o fazer. Esta decisão vem a mando de uma
facção fundamentalista religiosa, num país teoricamente laico, e com as maiores
liberdades do mundo, incluindo religiosa. No entanto, praticantes de outras
religiões, ou de nenhuma, levam por tabela. E esta decisão deixa a porta aberta
para que outras pessoas sejam ainda menos iguais. Os vizinhos não podem casar
com uma pessoa qualquer. Que vem a ser isto?
Com tanta coisa a acontecer, acho que já vivi acontecimentos
marcantes suficientes. Se calhar, podíamos ficar por aqui.
Ou, pelo menos, arranjar qualquer coisa menos marcante.
Assim tipo encontrar uma t-shirt gira, mas que é demasiado grande. “Tem igual
mas mais pequeno?”